Em 2015, foi firmado o Acordo de Paris entre 195 países, os quais se comprometeram a conter o aumento do aquecimento global através de medidas práticas. Um dos instrumentos adotados para atingir este objetivo foi o mercado de carbono.
O mercado de carbono é uma das estratégias para controlar a crise climática, colocando efetivamente um preço na poluição, além de criar um incentivo econômico para que as nações reduzam as emissões nocivas ao meio ambiente.
E, diante das muitas possibilidades, a produção de trigo merece atenção. Esse é o resultado de uma pesquisa conduzida pela Embrapa Trigo (RS) em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Os resultados dessa pesquisa comprovaram que o trigo é capaz de sequestrar mais carbono do que emite para a atmosfera, beneficiando o mercado de carbono.
Mercado de carbono: unindo o interesse econômico com a preocupação sustentável
Antes de entender mais sobre a pesquisa realizada pela Embrapa Trigo e UFSM vale entender o que é o mercado de carbono.
Segundo Anderson Santi, pesquisador da Embrapa Trigo, o mercado de carbono surgiu durante a ECO-92, ocorrida no Rio de Janeiro. “Na data, foi criada a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (UNFCCC, em inglês), que originou a fase embrionária do mercado de carbono”.
No entanto, muitos passos ainda eram necessários para que esse mercado, de fato, entrasse em vigor. Nesse sentido, a criação do Protocolo de Quioto em 1997 no Japão, definiu regras mais rígidas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) para os países signatários.
Considerando a premissa de que eram necessários 55% dos países que representassem 55% das emissões globais de GEE, o protocolo passou a vigorar em 2004, permitindo a precificação dos gases regulados no âmbito do Protocolo de Quioto bem como transações de certificados de redução entre as partes signatárias.
O mercado de carbono possui 2 modalidades principais
No contexto do mercado de carbono, convencionou-se de que uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) corresponde a um crédito de carbono, que será negociado no mercado nacional/internacional.
Em termos de mercado de carbono, Santi destaca que há duas modalidades principais, o mercado regulado e o mercado voluntário.
No primeiro caso as regras são definidas no âmbito dos governos locais, regionais ou federais. “Neste caso, o preço da tonelada é definido pelo órgão regulador e existe a obrigação de redução ou compensação de emissões, mas ainda não foi estabelecido no Brasil”.
No caso do mercado voluntário, a geração de crédito de carbono advinda da redução das emissões parte de iniciativa própria através de pessoas, empresas e organizações, onde o preço é negociado em contrato por projeto e já está em funcionamento no país.
“Nesse caso, alguns exemplos passíveis de geração de créditos de carbono passam pela adoção de agricultura sustentável e a regenerativa, eficiência energética, reuso de resíduos, energias renováveis, biocombustíveis, reflorestamento e preservação da mata”, complementa o pesquisador.
Considerando a extrema importância para o país, em termos de mitigação da emissão de GEE e combate às mudanças climáticas, o estabelecimento do mercado regulado no Brasil, está em discussão na câmara federal.
“Na câmara, há pelo menos cinco projetos de Lei que estão em andamento, versando sobre o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE)”, avisa Santi.
Trigo no Brasil: produção em expansão
O Brasil é o 8º maior importador de trigo do mundo. Em 2022, segundo dados do Ministério da Economia, foram importadas 5,8 milhões de toneladas.
Além disso, dados da CONAB indicam que a área de trigo no Brasil vem se expandindo continuamente nas últimas cinco safras, passando de 1,9 milhões de hectares em 2017 para 3,09 milhões em 2022, um crescimento de 61%.
As últimas projeções indicam que, em menos de dez anos, caso a produção brasileira de trigo cresça 10% ao ano, o volume do cereal poderá chegar a 20 milhões de toneladas/ano.
A elevação da produção do trigo pode também contribuir com o sequestro de carbono que seria emitido para a atmosfera, como indicado na pesquisa realizada pela Embrapa Trigo e pela UFSM.
Trigo: capaz de sequestrar mais carbono do que emite para a atmosfera
Como já citado, o trigo é uma cultura que tem grande potencial para o mercado de carbono, principalmente por ser capaz de sequestrar mais carbono do que emite para a atmosfera, segundo estudo da Embrapa Trigo e da UFSM.
Segundo Anderson Santi, o objetivo da pesquisa foi avaliar as diferenças entre emissão e retenção de carbono (balanço) no sistema de produção trigo-soja, quantificando os fluxos de CO2 em lavouras comerciais de grãos.
“Vimos que durante o ciclo produtivo, o trigo absorveu um total de 7.540 kg de CO2 por hectare da atmosfera, neutralizando as emissões dos períodos de pousio (sem plantas de cobertura do solo ou cultura geradora de renda sob a forma de forragem ou produção de grãos), e garantindo a oferta líquida de 1.850 kg de CO2 por hectare”.
Os resultados da pesquisa apontaram ainda os impactos negativos do pousio no sistema de produção de grãos em relação à emissão de CO2.
“Em apenas 30 dias, o pousio foi capaz de emitir 27% de todo o carbono que o trigo e a soja acumularam em 11 meses de cultivo”, destaca Santi.
Boas práticas agronômicas garantem a entrada do trigo no mercado de carbono
Na avaliação dos resultados da pesquisa, o trigo mostrou-se capaz de retirar mais carbono da atmosfera do que emite. Por isso, ele é citado como uma uma cultura “descarbonizante”, que ajuda a reduzir gases de efeito estufa da atmosfera como o CO2.
Mas, para que isso se confirme, Anderson Santi salienta que o manejo dispensado ao solo e às culturas deve seguir preceitos de boas práticas agronômicas.
“Essas práticas devem favorecer o acúmulo de carbono no solo, com destaque para o plantio direto e a rotação de culturas. Também é importante cuidar da racionalização e redução da utilização de insumos, como fertilizantes e defensivos agrícolas”, destaca o pesquisador.
No entanto, a cultura do trigo, ao entrar no mercado de carbono, será avaliada no contexto de sistema de produção, computando, além de suas contribuições individuais, àquelas fornecidas pelos outros componentes do sistema estabelecido pelo produtor rural.
No âmbito de mercado de carbono ainda não possuímos medições para o trigo, mas há dados, como os obtidos pela pesquisa citada, que demonstram a importância da cultura para o acúmulo de carbono no sistema de produção.
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