Você se lembra da greve dos caminhoneiros ocorrida em maio de 2018? Ela durou cerca de 10 dias e só acabou depois que o Governo Temer aceitou diversas exigências dos grevistas, como redução do preço do diesel e garantia de 30% dos fretes para autônomos. Mas a medida que gerou (e ainda gera) as maiores discussões foi o tabelamento de frete rodoviário.
Esta medida foi a mais controversa, principalmente para o agronegócio brasileiro, pois elevou fortemente os custos, tendo efeito adverso sobre a produção agrícola. Todos sabemos que o agronegócio brasileiro é um dos mais importantes em todo o mundo, mas o tabelamento de frete trouxe sérias consequências ao setor e, se manter igual às regras atuais, a produção agrícola pode se tornar insustentável. Por isso é fundamental que haja um equilíbrio entre o tabelamento de frete e a produção agrícola, mas isso é possível?
Tabelamento de frete. O que é e quais as consequências?
Certamente, o tabelamento de frete foi a consequência mais grave do “acordo” entre governantes e caminhoneiros. O advogado e especialista em direito econômico e defesa da concorrência, José Del Chiaro, explica que essa foi uma das principais exigências dos caminhoneiros para dar fim à greve nacional, que já causava sérias consequências.
“O Governo Federal entendeu que o estabelecimento de um valor mínimo para o frete rodoviário atenderia as demandas dos caminhoneiros e solucionaria o problema da gravíssima crise de logística que varreu o Brasil”, diz.
Del Chiaro explica que o tabelamento de frete foi uma medida introduzida pelo governo de forma provisória, que depois foi transformada em Lei (Lei 13.703/18), editada exclusivamente para conter as manifestações dos caminhoneiros no País.
Neste sentido, o advogado explica que o Brasil é caracterizado por uma economia onde as forças de mercado naturalmente agem para a elevação ou redução dos preços de mercadorias e serviços.
Porém o tabelamento surgiu como uma intervenção muito forte sobre as regras do mercado, fechando as possibilidades de uma atuação mais natural delas.
O agronegócio já sofreu forte impacto em decorrência do tabelamento de frete, já que teve custos muito maiores para transportar seus produtos, exercendo, dessa forma, forte impacto sobre o custo das safras brasileiras de grãos. Parte desse impacto, certamente, foi e continua sendo repassado para o consumidor final.
Única medida: confrontar o tabelamento judicialmente
Del Chiaro explica que assim que foi decretada, a Lei 13.703/18 autorizou a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) a editar a tabela com preços mínimos para o frete rodoviário. Assim, todos aqueles vinculados à cadeia de utilização do transporte de carga rodoviária estão sujeitos ao seu cumprimento, sob pena de multa, estabelecida na Resolução ANTT 5.833/18.
Dessa forma, o advogado explica que, por enquanto, a única medida que o produtor pode tomar é questionar o tabelamento de frete na justiça. “Aqueles produtores que acreditem que o frete mínimo pode causar prejuízos relevantes às suas atividades devem procurar medidas jurídicas para questionamento da tabela”.
Del Chiaro complementa: “Entendemos que a Medida Provisória 832/18 e na sequência a Lei 13.703/18 e as Resoluções dela decorrentes são inconstitucionais, inclusive objeto de questionamento perante o Supremo Tribunal Federal”.
Outras medidas para equilibrar essa relação muito desigual poderia ser a redução da dependência das rodovias para o transporte de cargas, transferindo o transporte para outros modais.
Mas há dois problemas neste sentido de difícil solução:
1- O Brasil não tem estrutura logística de transportes, impossibilitando a alteração pelo menos no curto prazo;
2 - Outros modais de transporte (ferrovia e hidrovias, por exemplo) têm precificado a sua atividade em função do valor do frete rodoviário correspondente, portanto tendem a ser influenciados pelo tabelamento de frete.
Como evitar prejuízos decorrentes do tabelamento de frete?
Já se passaram alguns meses do fim da greve e surgimento do controverso tabelamento de frete, mas os prejuízos são sentidos até os dias atuais pelo setor agrícola. Assim, segundo Del Chiaro, agir judicialmente é a medida mais cabível para o momento.
“A curto prazo, a ressalva de direitos nos parece a melhor forma de evitar prejuízos. Ou seja, se continuar contratando frete sem considerar os preços mínimos e deixar claro que o está fazendo por considerar a legislação impositiva do frete mínimo é inconstitucional”.
Neste caso, o advogado explica que, paralelamente, o produtor deve ajuizar as medidas judiciais compatíveis com essas condutas.
Del Chiaro entende que tanto as ações individuais pelas empresas prejudicadas como as atitudes das associações representativas dos produtores rurais são os canais adequados para o recurso ao Judiciário, passo necessário para ressalva dos direitos dos produtores.
Por fim, ele lembra que é legítimo que os produtores levem através de suas entidades representativas seu pleito aos novos congressistas eleitos e/ou ao novo Executivo que tomarão posse em 2019. “Com a edição da Lei 13.703/18, somente nova medida legislativa poderá alterar o status quo do tabelamento de frete", finaliza.
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