Vista por muitos como um caminho para a redução dos impactos ambientais, a agricultura regenerativa é uma técnica de proteção da fertilidade do solo usada por muito tempo, mas que está voltando assessorada pelas tecnologias atuais.
Essa é uma técnica que se propõe a melhorar a saúde do solo e promover a biodiversidade da área, melhorando o ciclo da água e sequestrando carbono ao mesmo tempo que produz alimentos nutritivos de forma lucrativa.
Essa é uma técnica cada vez mais utilizada por produtores de café em diversas regiões produtoras do país. Exatamente por isso, convidamos o Dr. Antonio Fernando Guerra, chefe-geral da Embrapa Café, para falar sobre a agricultura regenerativa, seus benefícios e sua aplicabilidade no agronegócio.
Agricultura regenerativa: saúde dos recursos naturais em primeiro lugar!
Termo criado pelo americano Robert Rodale, em 1983, a agricultura regenerativa é uma forma de conduzir a agricultura por meio de técnicas agrícolas com o objetivo de reabilitar e conservar os sistemas produtivos e alimentares, com foco principal na regeneração e conservação do solo.
Assim, o conceito tem forte ênfase na possibilidade de continuar produzindo e gerando frutos durante a recuperação, ou seja, além de visar a produção de alimentos, a agricultura regenerativa foca também na recuperação e a regeneração dos sistemas produtivos.
Para isso, essa técnica se baseia na agricultura orgânica, mas prioriza práticas de saúde do solo e gestão da terra, que são base da agricultura moderna.
“A agricultura regenerativa olha a saúde dos recursos naturais como prioritários no sistema produtivo. Nesse modelo, busca-se a recuperação de áreas degradadas, investindo na saúde do solo, com retenção de água, incorporação de carbono e ciclagem de nutrientes”, complementa Antonio Guerra.
Para além da sustentabilidade ambiental, a agricultura regenerativa remete ao tripé da sustentabilidade, olhando também a questão social e econômica na produção.
Técnicas utilizadas na agricultura regenerativa
A agricultura regenerativa é uma forma de produzir alimentos com o mínimo de impacto, visando menor interferência possível nos sistemas agrícolas.
Para isso, essa técnica prega a não utilização de fertilizantes sintéticos e defensivos agrícolas, o não revolvimento do solo e a maior diversidade de plantas possíveis integradas com o ambiente como um todo.
O pesquisador da Embrapa Café salienta que a quantidade de técnicas que os produtores podem empregar para atuarem num modelo regenerativo é bastante grande. “A escolha da técnica vai depender do estágio de cada propriedade, mas de modo geral, algumas são as práticas mais empregadas”.
Entre as práticas regenerativas mais recorrentes, se destacam:
- Rotação de culturas, caso da rotação de lavouras de cana-de-açúcar com soja, crotalária ou amendoim;
- Plantio direto: técnica que envolve o não revolvimento do solo, manutenção da palhada na superfície do solo e rotação de culturas, que são amplamente difundidos no Brasil;
- Consórcios: técnica representada pelo cultivo intercalado de duas ou mais espécies ao mesmo tempo na área. Ex: milho-braquiária;
- Tecnologias de fertilização – fazem uso de fertilizantes organominerais, pó de rochas, biochar, entre outros – em detrimento aos fertilizantes minerais;
- Compostagem: uso de materiais orgânicos - como restos de plantas e esterco animal decompostos - para fornecer nutrientes às plantas de uma forma mais sustentável;
- Uso de bioinsumos: São produtos naturais, como biofertilizantes e biopesticidas, que auxiliam no manejo de doenças e pragas de forma menos prejudicial ao meio ambiente. Esses produtos são derivados de micro-organismos benéficos e substâncias naturais;
- Sistemas de integração, como a integração de animais nos sistemas produtivos.
Técnica que tem tudo para ganhar espaço no futuro da agricultura
Quando bem aplicada, a agricultura regenerativa caminha em conjunto com a demanda mundial por tecnologias mais sustentáveis que atendam às necessidades de produção de alimentos e ao mesmo tempo contribua com a redução de impactos negativos.
Neste cenário, o chefe-geral da Embrapa Café destaca que os mercados estão cada vez mais atentos e exigentes em relação à forma que os produtos que eles consomem são produzidos.
“Essa exigência causa uma pressão em toda a cadeia produtiva, não só na indústria, mas também no agro, forçando mudanças nos sistemas de produção para que todos se mantenham competitivos”.
Além disso, cada vez mais os produtores entendem a necessidade de estabelecer sistemas sustentáveis com potencial para a regeneração dos recursos naturais de modo a conviver com mudanças no clima, sem os quais não sobreviverão e a agricultura regenerativa atende todos os pré-requisitos.
Produção cafeeira: o melhor case de sucesso da agricultura regenerativa
Na atualidade, os consumidores têm exigido sistemas produtivos cada vez mais sustentáveis. Neste caso, Antonio Guerra explica que a produção de café é muito exigente.
“O café é uma cultura perene. Isso leva o produtor a ter uma relação longa com a planta e com o ambiente em que ela está inserida. Os cafeeiros só produzem em ramos novos, portanto necessitam ser podadas de tempo em tempo para se manterem produtivos”.
Nesse processo de podas, há a incorporação de materiais orgânicos, resultando em significativo sequestro de carbono do sistema produtivo.
Além disso, o custo de implantação de uma lavoura de café é alto e o produtor tem que fazer um bom manejo para manter essa planta saudável e produtiva por muitos anos.
O chefe-geral da Embrapa Café ainda destaca que a cafeicultura é majoritariamente realizada pela agricultura familiar, com produtores que se organizam em associações e cooperativas para melhorar a produção e para vender seus produtos.
“Esse modelo é bastante positivo para se estabelecer práticas sustentáveis, com a utilização de tecnologias, que são resultado de anos de pesquisa, inclusive com base na agricultura regenerativa”.
Neste contexto, Guerra destaca que a Embrapa Café coordena um consórcio que agrega mais de 40 instituições de pesquisa, dentre elas centro de pesquisa da própria Embrapa, universidades, organizações estaduais de pesquisa, instituições privadas, dentre outras. “São mais de mil profissionais voltados a estabelecer uma cafeicultura cada vez mais produtiva e sustentável”, diz.
O pesquisador também explica que no Brasil, o café é o produto agrícola com maior número de Indicações Geográficas (IG). “Para conseguir o registro de uma IG é necessário cumprir vários requisitos, muitos deles relacionados ao tripé da sustentabilidade”.
Segundo Guerra, este é um bom exemplo que podemos dar em relação aos resultados de uma produção preocupada com a sustentabilidade e consequentemente com a qualidade de seu produto.
“Já conseguimos feitos gigantescos, a participação brasileira na produção mundial, de acordo com a Organização Internacional do Café (OIC), passou de 19%, em 1997, para em torno de 30%, em 2022, sendo que a área destinada ao cultivo encolheu em 20%, no mesmo período”, finaliza.
Diante disso, a ideia é que cada vez mais as boas práticas de agricultura regenerativa estejam unidas às novas tecnologias, contribuindo para a redução da emissão dos gases de efeito estufa, economia de água, diminuição na aplicação de agroquímicos e garantindo uma produção mais sustentável.