Você imaginou beber uma bebida alcoólica muito semelhante ao vinho tinto, mas que não é feita de uva, e sim de polpa de açaí?
Produzida a partir de um fermentado alcoólico à base da fruta de origem amazônica, essa bebida é produzida pelo empreendimento Flor de Samaúma, dedicado ao ecoturismo e à bioeconomia em Macapá (AP).
Em uma análise realizada pela Embrapa Agroindústria Tropical (CE) este fermentado de açaí apresenta características físico-químicas e sensoriais semelhantes a alguns vinhos tintos. Também demonstrou aceitação de provadores, consumidores de vinho, indicando bom potencial de comercialização.
Principais características e composição do fermentado de açaí
Como já destacado, essa bebida alcóolica apresenta características físico-químicas e sensoriais semelhantes a alguns vinhos tintos, inclusive na sua composição. Os perfis físico-químicos deste fermentado revelam esta proximidade entre as duas bebidas.
De acordo com o chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical, Gustavo Saavedra, a bebida da polpa de açaí possui teor de álcool semelhante ao vinho. “Em nossas pesquisas o fermentado da polpa de açaí apresentou um teor alcoólico de 12%. De forma geral, os vinhos têm cerca de 15%”.
Os teores de açúcar desta bebida foram de 1 a 3 mg/l. Saavedra destacou que mesmo mais alto quando comparado ao vinho, a doçura desta bebida não é perceptível.
Quanto à acidez, ela também é um pouco mais alta que o vinho tinto. “Os vinhos, de forma geral, têm uma acidez titulável de 4 a 8 (pH). Já o fermentado de açaí apresentou um pH de 7. Acredito que podemos trabalhar melhor essa acidez”, destaca Saavedra.
Os pesquisadores também identificaram que a quantidade de polifenóis era muito semelhante ao vinho, apresentando cerca de 2500 mg/L.
Além disso, o teor de proteínas, a presença de vitamina C e a intensidade de cor são outros pontos que aproximam as duas bebidas.
“Em nossas pesquisas e análises, identificamos que muitas são as analogias do fermentado de polpa de açaí com o vinho tinto tradicional. Por isso, ele vem sendo chamado de vinho de açaí”, complementa o pesquisador da Embrapa.
A bebida surpreendeu provadores e teve boa aceitação
De acordo com o chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical, o fermentado da polpa de açaí surpreendeu os provadores, que identificaram similaridades sensoriais com o vinho.
Avaliado por 50 pessoas que são habituais consumidores de vinho, a bebida apresentou uma aceitação de 74%, índice superior ao exigido para a comercialização do produto.
A aceitação foi avaliada em uma escala que varia de “desgostei muitíssimo” a “gostei muitíssimo”. Os participantes também foram perguntados sobre a intenção de compra utilizando uma escala de “certamente não compraria” a “certamente compraria”.
Com essas pesquisas, Saavedra acredita que o produto apresenta grande potencial de inserção mercadológica, mas ainda precisa passar por ajustes tecnológicos e até estruturais.
“Nossa ideia não era comparar o fermentado de açaí com o vinho. Tínhamos como principal proposta saber se as pessoas iam gostar dessa bebida e se teriam a intenção de compra”, salienta o pesquisador.
Desafios dessa bebida para ganhar mercado
Mesmo tendo uma boa aceitação de provadores, tanto a produção quanto a comercialização dessa bebida apresentam muitos desafios.
O primeiro destes desafios é produzir essa bebida em escala. “A produção de uvas para a fabricação do vinho é muito conhecida e usa técnicas milenares. Para o açaí, temos cerca de 10 anos de produção, além de produzirmos em baixa escala (especificamente para a produção do fermentado)”.
Outra dificuldade que ainda precisa ser superada é aliar a escala (quantidade) com uma produção de qualidade, além de um processo de transformação adequado para a produção da bebida.
“De fato, uma das principais vantagens dessa bebida é sua produção sustentável e oriunda da Amazônia, mas é fundamental também investir em qualidade”, opina Saavedra.
O chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical destaca também que um outro grande desafio é a necessidade de estruturação da cadeia de produção e logística.
Ele salienta que o açaí é produzido na região amazônica, essencialmente no Amapá, Acre e Pará, dificultando a logística de transporte para outras regiões.
Além disso, há a necessidade de organizar toda a cadeia logística de insumos, como garrafas de vidro, levedura e demais produtos.
“Para superar esses desafios, uma ideia interessante, pelo menos em um primeiro momento, é vender essa nova bebida com um status premium, cujo público-alvo são aquelas pessoas que estão dispostas a pagar mais”, acredita Saavedra.
O potencial de mercado é grande, mas exige estruturação
Saavedra tem certeza de que o fermentado da polpa de açaí tem um gigantesco potencial de mercado. Mas para isso, ele sugere que o primeiro passo é não vender essa bebida como “vinho de açaí”.
“Acredito que falta dar uma identidade única para essa bebida, separando-a da designação de vinho. O vinho já tem sua identidade e está relacionado à uva. O açaí precisa seguir o mesmo caminho e ter sua identidade própria”.
O pesquisador sugere realizar tentativas de nome e apresentação dessa bebida, principalmente para dar a característica amazônica para este produto.
Além disso, é preciso fazer com que este produto chegue ao consumidor, estimulando-o a comprar, degustar e gostar e recomprar.
Assim, os próximos passos são:
- Estabelecer um nome que identifique essa bebida;
- Realizar um estudo de mercado de potencial de inserção da bebida;
- Estruturar toda a cadeia de produção e logística (processo de médio a longo prazo)
Por fim, Saavedra destaca que serão necessárias décadas de estruturação de toda a cadeia, em um planejamento de longo prazo. “Acredito que somente daqui a 10 ou 20 anos veremos a bebida alcoólica do açaí alicerçada no mercado”.
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